Para a justiça, faltaram provas. Para a comunidade da Gafanha Baixa, na Murtosa, a maior prova de todas foi ignorada: o amor incondicional de Mónica Silva pelos seus dois filhos. É em nome dessa certeza que a terra que viu a grávida de 33 anos crescer se recusa a aceitar a absolvição de Fernando Valente, o principal suspeito do seu desaparecimento e homicídio. A revolta que se vive na região é alimentada por uma convicção que nenhum tribunal conseguiu abalar: Mónica nunca abandonaria os filhos.

Dois dias depois de o Tribunal de Aveiro ter ilibado o empresário, o sentimento de injustiça domina as conversas, e o argumento é sempre o mesmo.
“A Mãe que Ela Era Não Deixava os Filhos”
Quem conhecia Mónica Silva não tem dúvidas. A teoria de um desaparecimento voluntário é, para eles, impensável. A sua vida girava em torno dos seus dois rapazes, hoje com 12 e 15 anos. É esta a âncora da “sentença” popular.
“Talvez alguém ainda pense que ela esteja viva, mas eu não. Ela tem dois filhos e eu conhecia-a. A mãe que ela era não deixava os filhos sem resposta“, frisa Lurdes Campos, uma comerciante local, ao Jornal de Notícias. A mesma opinião é partilhada por Paula Couras, outra moradora que a conhecia bem: “Não acredito que esteja viva. Se estivesse, tentava ver os filhos, pois era muito próxima deles“.

Esta certeza transforma a dor da ausência numa fúria contra a decisão do tribunal, vista como um insulto à memória de Mónica como mãe.
Uma Comunidade em Luto e Revolta
A leitura da sentença, na passada terça-feira, foi acompanhada com o coração nas mãos por toda a comunidade. A absolvição caiu como uma bomba. “Eu, quando soube que o tinham absolvido, as lágrimas caíram-me até ao chão”, confessou Lurdes Campos. Noutros locais, a indignação foi tal que levou os moradores a desligar a televisão, especialmente por respeito pela família de Mónica, que se encontrava presente.

“O que é que se há de sentir? Se fosse com uma filha minha, eu também não gostava. Ele havia de ficar preso, é só o que eu tenho a dizer”, resumiu Vera Matos, prima da vítima.
O Mistério que Permanece
A falta de um corpo ou de qualquer vestígio de Mónica quase dois anos depois do seu desaparecimento em outubro de 2023 só adensa a suspeita sobre Fernando Valente. A comunidade acredita que ele é o único com as respostas. “Há provas em como o Fernando Valente foi a casa da Mónica, o filho diz que ouviu a conversa, por isso ele tem de saber onde é que ela está”, insiste Paula Couras.

Enquanto a justiça formal encerrou (para já) o caso por falta de provas, a justiça popular da Murtosa já tem o seu veredicto. Um veredicto proferido em nome de dois filhos que ficaram sem mãe e que alimenta uma revolta que não perdoa.